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Liminar contra Assédio Eleitoral

PODER JUDICIÁRIO


JUSTIÇA DO TRABALHO


TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 17ª REGIÃO


VARA DO TRABALHO DE ARACRUZ
ACPCiv 0000807-80.2022.5.17.0121
AUTOR: MINISTERIO PUBLICO DA UNIAO
RÉU: IMETAME METALMECANICA LTDA
DECISÃO DE TUTELA DE URGÊNCIA
COM FORÇA DE MANDADO DE CUMPRIMENTO
Vistos etc.
Trata-se de Ação Civil Pública, com pedido de tutela provisória de urgência
antecipada incidental, proposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO - MPT em face de
IMETAME METALMECANICA LTDA., partes devidamente qualificadas, em que se busca tutela inibitória
com o objetivo de evitar a prática do alegado ilícito (assédio eleitoral), sua continuação ou repetição,
independentemente da existência de dano, bem como a reparação
in pecunia do suposto dano moral coletivo
e individual praticado.
Em razão dos fatos narrados na inicial, defende o autor que:
[...] a ré realizou reunião, em ambiente de trabalho,
com o propósito de expor seus trabalhadores a um discurso com aptidão
para interferir na escolha política. Operou-se, assim, influência e pressões
ilícitas, por parte dos empregadores, a respeito da escolha a realizar-se nas
eleições presidenciais, com o propósito de obter o engajamento subjetivo
dos trabalhadores a determinado projeto ideológico e, consequentemente,
obter influência ilícita no direito de escolha materializado pelo voto, sob
ameaças veladas deperda dos empregos.
Informa o autor, ainda, que apurou as denúncias de assédio eleitoral recebidas,
tendo expedido, com urgência, Notificação Recomendatória (n. 6759.2022) à empresa Ré, recomendando “
a
abstenção imediata de qualquer ato atentatório ao direito de livre escolha do voto dos trabalhadores
”,
bem como “
a realização de nova reunião com os trabalhadores para reafirmar a liberdade do voto e a
ilegalidade do assédio eleitoral”
.
Que,
“diante disso, o Réu apresentou manifestação em que alegava que, por não
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haver menção ao nome de determinado candidato, não haveria qualquer ilegalidade na conduta” e que o
discurso teria sido descontextualizado.
Que
“o réu afirmou que não cumpriria a Recomendação expedida pelo MPT e
requereu a realização de audiência para prestar esclarecimentos”
, não tendo comparecido, contudo, no
horário da audiência aprazada, uma vez que compareceu à secretaria da Procuradoria do Trabalho no
Município de Colatina com atraso de 40 minutos.
Em sede de
tutela provisória de urgência de natureza antecipada, pelas razões
expostas no item 4.8 da inicial, pleiteia o autor, seja determinado à ré o cumprimento das obrigações de fazer
e não fazer elencadas no item 5 da exordial.
Analiso.
No âmbito do processo coletivo, a possibilidade de antecipação dos efeitos da
tutela pretendida está prevista no artigo 12,
caput, da Lei da Ação Civil Pública - nº 7.347/85.
De igual modo é a previsão do artigo 84, § 3º, do CDC, aplicável à disciplina da
ação civil pública por força do artigo 21 da Lei nº 7.347/85, segundo o qual “
na ação que tenha por objeto o
cumprimento da obrigação de fazer ou não fazer, o juiz concederá a tutela específica da obrigação [...]
” e,
sendo relevante o fundamento da demanda e havendo justificado receio de ineficácia do provimento final, é
lícito ao juiz conceder a tutela liminarmente ou após justificação prévia, citado o réu
”.
Já no âmbito do processo individual, consoante o artigo 300 do Código de
Processo Civil, aplicável subsidiariamente ao Processo do Trabalho, por força do artigo 769 da CLT, a agora
denominada tutela provisória de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a
probabilidade do direito e o perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo, desde que não haja perigo
de irreversibilidade da medida.
Analisando os autos, tais requisitos estão satisfeitos.
Conforme artigo 1º da Constituição Federal – CRFB a República Federativa do
Brasil constitui-se em Estado Democrático de Direito, onde todo o poder emana do povo (soberania popular),
que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos da Constituição.
A forma de exercício da soberania popular se dá pelo voto, que além de universal,
é direto, secreto e com valor igual para todos, nos termos do artigo 14 da CRFB.
O voto, pois, é uma liberdade de autodeterminação política de cada cidadão, um
direito fundamental que deve ser assegurado.
Por tais razões, o comportamento do empregador no sentido de direcionar o
empregado a votar ou não em um determinado candidato configura assédio eleitoral, sendo conduta
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gravíssima e atentatória ao exercício da democracia, que pode vir a configurar o crime previsto no Código
Eleitoral em seu artigo 297.
In casu, os fatos noticiados estão comprovados pelos vídeos divulgados no link
https://1drv.ms/u/s!Amr93NBIjQTNgvRzhkgA-_95yE5wiw?e=TOfupC”, os quais demonstram uma
numerosa quantidade de empregados da empresa ré, todos uniformizados, assistindo ao empregador, o
empresário e sócio Etore Selvatici Cavallieri, discursar com nítido conteúdo político e de direcionamento dos
seus trabalhadores a votarem em determinado candidato à Presidência da República, conforme se verifica no
trecho do vídeo 2 em que o empregador profere a seguinte mensagem:
“Quando você vê pessoas falando coisas
negativas de quem faz realmente esse país ir pra frente e você ainda tem
coragem de votar nessas pessoas.
No futuro, no futuro, você não vai poder
reclamar. O dia que você não tiver emprego, você não vai poder
reclamar. Porque você escolheu. Você escolheu.
Quantos empregos, quantos
mil empregos, o Espírito Santo teria a mais, quanta geração de recurso de
impostos o Espírito Santo teria a mais –
terá, porque nós vamos conseguir essa
estrada de ferro. Nós vamos conseguir se nós votarmos nas pessoas certas
.”
Registro, ainda, que, conforme comprovado pelo Autor, os fatos noticiados foram
objeto de 08 denúncias ao MPT, o que,
prima facie, comprova que os empregados se sentiram pressionados a
votar conforme direcionamento apontado por seu empregador.
Destarte, presente, pois, a probabilidade do direito.
Também se faz presente o perigo da demora, uma vez que faltam apenas 03 (três)
dias para o segundo turno das eleições do ano 2022, sendo primordial que os empregados da ré sejam
esclarecidos, com urgência, quanto a sua liberdade de voto conforme sua própria convicção política, bem
como que não sejam novamente pressionados a votar conforme direcionamento apontado pelo empregador.
Por fim, não há que se falar em irreversibilidade da medida, uma vez que a tutela
provisória pretendida apenas visa assegurar um direito constitucional fundamental de todo e qualquer
cidadão, o direito ao voto livre, conduta esta incapaz de gerar dano à empresa ré.
Pelo exposto, defiro o pedido de tutela de urgência pleiteada pela parte autora a
fim de determinar que a parte ré cumpra as seguintes obrigações, sob pena de multa no importe de R$
20.000,00 (vinte mil reais) por infração, acrescida de R$ 10.000,00 (dez mil reais), por trabalhador
prejudicado, nos casos dos pedidos 1,2, 3, 4 e 8, e de R$ 10.000,00 (dez mil reais) por dia, no caso dos
pedidos 5, 6 e 7:
1) ABSTENHA-SE, por si ou por seus prepostos, de utilizar em bens móveis
e demais instrumentos laborais dos empregados da parte requerida propaganda ou imagens com
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referências político-partidárias;
2) ABSTENHA-SE, por si ou por seus prepostos, de adotar quaisquer condutas
que, por meio de assédio moral, discriminação, violação da intimidade ou abuso de poder diretivo,
intentem coagir, intimidar, admoestar e/ou influenciar o voto de quaisquer de seus empregados nas eleições
para todos os cargos que ocorrerão no próximo dia 30/10/2022;
3) ABSTENHA-SE, por si ou por seus prepostos, de obrigar, exigir, impor, induzir
ou pressionar trabalhadores para realização de qualquer atividade ou manifestação política em favor ou
desfavor a qualquer candidato ou partido político;
4) ABSTENHA-SE, por si ou por seus prepostos, de permitir e/ou tolerar que
terceiros que compareçam a quaisquer de suas instalações pratiquem as condutas descritas nos itens
1,2 e 3;
6) ABSTENHA-SE de discriminar e/ou perseguir quaisquer dos
trabalhadores, por crença, convicção política ou filosófica, de modo que não sejam praticados atos
de coação eleitoral, no intuito de constrangimento e intimidação;
7) ABSTENHA-SE de ameaçar realizar e/ou realizar dispensa
discriminatória fundada em orientação política;
8) ABSTENHA-SE de conceder ou de realizar qualquer promessa de
concessão de benefício ou vantagem a pessoas que buscam trabalho ou possuem relação de trabalho com
sua organização (empregados, terceirizados, estagiários, aprendizes, entre outros) em troca do voto de
tais pessoas em candidatos ou candidatas nas próximas eleições;
9) REUNIR, em prazo não superior a 24 (vinte e quatro) horas após a
intimação judicial, todas as pessoas que possuem relação de trabalho com sua organização
(empregados, terceirizados, estagiários, aprendizes, entre outros), de modo a atingir
a INTEGRALIDADE DOS TRABALHADORES, para dar ciência pessoal a todos, e comunicar o
seguinte texto, sugerido pelo Ministério Público do Trabalho:
A EMPRESA IMETAME METAL MECÂNICA LTDA
em atenção AO TERMO DE AJUSTE DE CONDUTA FIRMADO, vem a
público DECLARAR que seus empregados tem o direito de escolherem
livremente seus candidatos nas eleições, independentemente do partido
ou ideologia política, garantindo a todos os seus funcionários que não
serão adotadas medidas de caráter retaliatório, como a perda de
empregos, caso votem em candidatos diversos daqueles que sejam
da preferência do(s) proprietário(s) da empresa, tampouco será realizada
campanha pró ou contra determinado candidato, coagindo,
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intimidando, admoestando e/ou influenciando o voto dos empregados com
abuso de poder diretivo;
10) DIVULGAR o seguinte comunicado:
“Atenção: EMPRESA IMETAME METAL
MECÂNICA LTDA., em atenção à DECISÃO JUDICIAL proferida na Ação
Civil Pública n. 0000807-80.2022.5.17.0121, ajuizada pelo Ministério Público
do Trabalho, vem a público afirmar o direito de seus empregados
livremente escolherem seus candidatos nas eleições, independentemente do
partido ou ideologia política, garantindo a todos os seus trabalhadores que
não serão adotadas medidas de caráter retaliatório, como a perda de
empregos, caso votem em candidatos diversos daqueles que sejam da
preferência do(s) proprietário(s) da empresa, tampouco será realizada
campanha pró ou contra determinado candidato, coagindo, intimidando,
admoestando e/ou influenciando o voto dos empregados com abuso de
poder diretivo”;
A divulgação do comunicado deve ser feita até o dia 30/10/2022,
cumulativamente:
(10.1) em todos os quadros de avisos de todos os estabelecimentos da
ré, mantendo-o afixado até o dia 30/10/2022, inclusive;
(10.2) na página principal inicial do sítio eletrônico da ré na Internet,
mantendo-o em posição de destaque até o dia 30/10/2022, inclusive;
(10.3) em publicação nas redes sociais da ré, a qual deverá
permanecer em posição de destaque e sem qualquer restrição a acesso do público externo;
(10.4) por e-mail a todos(as) os(as) trabalhadores(as), a qualquer
título, que laborem de forma presencial ou em regime de teletrabalho;
(10.5) mediante entrega de cópia física do comunicado, mediante
recibo, a todos(as) os(as) trabalhadores(as), a qualquer título, que laborem de forma
presencial. No caso de trabalhadores(as) em regime de teletrabalho, a entrega deve ser feita via
e-mail corporativo ou outro meio similar à disposição da empresa, com comprovante de entrega,
no prazo de até 5 (cinco) dias úteis contados da intimação judicial;
11) ASSEGURAR a participação no pleito eleitoral dos trabalhadores que tenham
de realizar atividades laborais na data de 30 de outubro de 2022, inclusive aqueles que desempenhem sua
jornada no regime de compensação de jornada no regime de 12 x 36 horas.
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Em caso de descumprimento, os valores das multas serão revertidos à reparação
dos bens meta individuais lesionados por meio das ilicitudes cometidas pela ré, ou a Fundo de Direitos
Difusos –FDD, previsto na Lei n. 9.008/95; ao Fundo de Amparo ao Trabalhador–FAT (art. 11, V,
Lei nº 7.998/90), ou a outra destinação definida por este Juízo em conjunto com o MPT, a ser definido na
fase de cumprimento de sentença.
Intime-se o autor do teor desta decisão.
Notifique-se a ré, com urgência, (utilizando-se de todos os meios telemáticos
possíveis), com as advertências de praxe, sobre o teor desta decisão.
Após comprovado o cumprimento da presente decisão, por certidão do Senhor
Oficial de Justiça Avaliador, inclusive mediante verificação em todos os canais de comunicação acima
expressos, façam-se conclusos para outras deliberações.
A presente decisão tem força de mandado de cumprimento.
Havendo necessidade, ou se forem opostos obstáculos ao cumprimento do presente
MANDADO, fica o Sr. Oficial de Justiça autorizado a solicitar auxílio da força policial; dar cumprimento à
ordem excepcionalmente aos domingos, feriados e após às 20h00min (CLT art. 770 e Parágrafo Único; CPC
art. 212, §§ 1º e 2º).
Adverte-se que o descumprimento da presente ORDEM configurará CRIME DE
DESOBEDIÊNCIA, sujeitando-se o Autor às penas da lei, nos termos do art. 330 do Código Penal Brasileiro,
sem prejuízo das demais sanções aplicáveis.
Cumpra-se.
ARACRUZ/ES, 27 de outubro de 2022.
VITOR HUGO VIEIRA MIGUEL
Juiz do Trabalho Titular
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